Vários tempos


Vários tempos, portanto. O tempo quase indefinido, suspenso, que vem de uma relação com o sagrado, de planos simbólicos, dos guerreiros disformes cujo olhares convocam o nosso olhar e se deslocam à medida que nós próprios os olhamos. O tempo mais concreto das oficinas metalúrgicas, das forjas, das serralharias, do mundo industrial. O tempo indistinto de materiais que parecem recolhidos ao acaso e que uma aparente desordem vai juntando, sobrepondo, justapondo.

Neste processo que envolve autor e espectador num mesmo jogo de sucessivas interacções cada uma das esculturas de José Coelho reinventa-se em novos sentidos e abre-se em novas possibilidades de ver e entender o mundo.
José Carlos Barros
Vice-presidente da Câmara Municipal de Vila Real de Santo António
Guerreiros e Paveias na obra de José Coêlho- “Memento Mar Memor”
Qualquer pessoa que visite como turista ou crente o Mosteiro Guadalupe, em Espanha, e consiga subir ao Camarím da igreja sob o comando Franciscano, colocando-se em frente às pinturas da Luca Giordano (escola italiana séc. XVI) tenderá a procurar/perceber com olhar as formas “alongadas” que se espraiam por entre todas as pinturas, colando-as umas às outras. Precisará, no entanto, de enveredar por uma aventura corporal, nomeadamente em ser capaz de reposicionar, constantemente, o seu corpo face ao espaço de forma a seleccionar o mais possível o local exacto, posição e ângulo que possibilitam visualizar/identificar tudo o que ecoa nas próprias pinturas.
Tradicionalmente, a pintura e a escultura privilegiaram o olho, o olho do artista e também do espectador que se uniam num único ponto de fuga da representação e, exemplos como o de Giordano são capazes de traçar linhas de continuidade com propostas como a de José Coelho, onde o olho acaba por se transformar num corpo que, de forma efectiva, age num espaço e dessa acção faz depender a leitura da própria obra.

Pedro Cabral